quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Cap.3: Padrão de perfeição

“Ela morava numa casinha haaa, enfeitada daa de cupim pimpim, olhou pro alto tôtô, uma lagartixa xaxa olhou pra ela, olhou pra ela e fez assim: HUHU...”.
A casinha era tão bonita, que até a decoração com o “toque rústico e empobrecido dos cupins”, aos olhos dela eram perfeitos, mas por que, por que aquela lagartixa, arg?!
“Drogaaa, com um imperfeito tão perfeito aos seus olhos, aquela lagartixa malvada deu língua pra ela?! O que ela fizera de mal?! Ela nem a conhecia... Talvez fosse porque ela ainda fazia xixi na cama.” :X
“ Hummm será?! Ô bichinho intrometido viu! O que tinha com isso?! Aff, a vovó não se importa!!! Será?! Na verdade é algo bem trabalhoso...”
Pronto! O insulto da lagartixa fora trocado por doses de culpabilidade... Quem era aquele bichinho intrometido pouco importava, pois tudo que ela não precisava naquele momento era sentir-se novamente perdendo alguém... Drástico isso né?! Rsrs, mas o fato era que a menina possuía tanto medo no olhar que já transparecia tão natural tornando isso imperceptível... era tão estranho aquele medo da solidão... O pai dela partira, foi morar no céu, era o que diziam... “Porque ele foi morar tão longe? Porraaa*, ele nunca vem me ver, será que está no céu mesmo?! E a mamãe? Porque não está aqui?” Claro que ela nunca ousou perguntar, isso poderia machucar alguém... Além do mais sua mãe a visitava o suficiente para ela admirá-la ao ponto de um dia querer ser como ela...
 ”Nossaaa, a minha mãe é a mais bonita do mundo!!! Queria que meus amigos a vissem, morreriam de inveja e parariam de dizer que seria abandonada na escola, mas ela não tem tempo, sabe, ela é muito inteligente e precisa cuidar de tanta coisa da família, além do mais minha pequenina irmã, precisa muito dela, e eu já sei me virar, a minha vovó cuida de mim com muito amor...Hummm, mas que porra, ela bem que poderia vir me buscar no horário né?! Assim o choro cessaria e não seria mais a boboca da turma... mas porque esse choro dia após dia, se ela sempre vem? Sei lá e se eu fiz algo que a deixou furiosa ou mesmo triste e ela não quer mais me ver... Humm, será que hoje ela vem? Que bommm, ela veio!!! Acho qu ela faz de propósito, afffff.”
Aos cinco anos ela já se preocupava bastante. Dizem que criança não entende nada, bem isso eu não sei, mas sei que elas criam seus próprios mundos e talvez o perigo esteja aí, embora de forma inocente, algo de estranho existia no interior daquela menina, no entanto passava-se despercebido... Tudo que se via era a menina bonitinha, orgulho da família... Talvez ela um dia vá torna-se médica... Mas o que queria mesmo era aparecer, afinal todos a admiravam tanto, que aquilo precisava se perpetuar... Mesmo que de forma inconsciente, algo assim tomava conta dela... “Já sei o que vou ser quando crescer!!! Vou trabalhar na televisão, vou ser repórter, elas são tão bonitas e inteligentes!!! Bonita todo mundo diz que já sou e inteligente também, já sei ler e tudo...Mas o que eu queria mesmo era ser paquita, já pensou eu ao lado da Xuxa? Nossaa a Xuxa é tão linda... Mas não sei dançar, então não posso, mas posso aprender né?! Não, não, não, não tenho tempo, que porra*!!! Ah deixa pra lá, preciso estudar, se não deixarei de ser inteligente e todo mundo vai ficar triste comigo. Não posso deixa-los tristes, afinal o papai morreu e já tem muita gente que não gosta de mim, não sei porque, mas ouvi alguém dizer que fulano, ciclano, etc etc, brigam porque eu nasci, algo assim, mas meu vô e minha vó vai brigar se eu perguntar, além de tudo criança educada não presta atenção às conversas dos adultos... Hummm então não posso deixa-los tristes, não e não”... Enfim, ela fora uma criança silenciosa, perdida em milhares de porquês. Talvez um dia ela voltasse o olhar para a Filosofia... Ah, mas isso todo mundo faz! Todo ser consciente pergunta-se os porquês que envolvem sua existência né?! Pois é, ela pouco olhou para a filosofia, o que todo mundo podia fazer era pouco pra ela, isso era muito pouco, tipo: “Nem sei quem foram Sócrates, Aristóteles ou Platão, nem tão pouco desejo saber” (A menina boazinha já contava com certa dose de arrogância, imperceptível aos próprios olhos, não sabia que indagar é fácil, o difícil é descobrir as respostas obscuras ou iluminadas que se derivam neste amplo espaço, correspondente ao mundo de cada ser)...
* Já contava com um vocabulário agressivo, afinal era assim que as pessoas mostravam como conseguir o que desejavam... chorar também era alternativa...
...Logo, tudo que era considerado pouco, era descartado, mas como alguém pode fazer “muito” sem começar pelo “pouco”?! Foi fatal, logo tudo que fosse “grande” tornou-se quase impossível de se realizar, como ela chegaria ao topo sem subir os degraus? Ela daria um jeito, era o que dizia, no entanto, para pular etapas, subir cinco ou seis degraus de uma vez, era o seu objetivo... Mas, suas pernas não alcançavam e seus braços não eram fortes o suficiente para criar alguma manobra mirabolante, rsrs, bem por que sua coordenação motora também pouco colaborava... A teimosia imperava: “Não, não vou pôr meu pé no primeiro degrau, que perda de tempo!!!" Sou inteligente, logo descobrirei uma forma, para tanto, preciso pensar, é isso, preciso pensar!!!  E de tanto pensar, cochilava e de tanto cochilar acostumara-se a dormir e de tanto dormir esquecia, gostou de esquecer e de tanto esquecer desistiu de tentar, logo, estava estagnada... “Mas que Drogaaa, isso me incomoda pra caramba, amanhã vou dar um jeito nisso, afinal sei bem me virar!!!” E de tanto esperar, cansou-se e por estar cansada culpou-se e sofreu, e, de tanto sofrer sentiu-se sufocada, logo, precisava respirar, para tanto responsabilizou outrem... “Claro que não tenho culpa, vocês é que pediram para eu ser destaque, como posso me destacar seguindo o mesmo caminho que os outros?! Decidam-se!!!” Nossaaa, a menina era teimosa como uma mula, mas tratava disso com um nome mais bonitinho: determinação... Se existisse um muro, ela usava toda sua fúria para derrubá-lo indo de encontro a ele, nesses esbarrões feria-se tanto a ponto de ficar prostrada, mas alguém sempre a socorria, ela pouco entendia por que... ”Trouxeram-me uma escada, ah fala sério, acham que não consigo? Não preciso da compaixão de vocês, eu sou capaz!!! ”  Os esbarrões recomeçavam, as dores aumentavam... Era preciso reconsiderar, talvez ela não estivesse no caminho certo... “Está bem vou pela escada, se você está me oferecendo é porque me ama, mas saiba que não deve me cobrar por isso, eu não te pedi nada”. Porque ela respondera daquele jeito sempre e sempre, logo ela tão boazinha, porque estava agindo assim?! Porque estava sempre frustrada? _Pronto, decidi, a resposta é:_ Não!!! Não aceito ajudas, logo ficarei em silêncio e ninguém mais se fere! Entretanto, seu remédio pouco ajudou e a dosagem da sua decisão a intoxicou. Estagnação e frustração representavam o seu CID (Nossaaa, ela possuía um CID, rsrs), logo ela passara a definir-se: “Um vazio, recheado de nada, no escuro”... (Taty Vieira).
Quando renunciamos aos nossos sonhos e encontramos a paz - disse ele depois de um tempo - temos um pequeno período de tranquilidade. Mas os sonhos mortos começam a apodrecer dentro de nós, e infestar todo o ambiente em que vivemos. Começamos a nos tornar cruéis com aqueles que nos cercam, e finalmente passamos a dirigir esta crueldade contra nós mesmos. Surgem as doenças e psicoses. O que queríamos evitar no combate - a decepçao e a derrota - passa a ser o único legado de nossa covardia. E, um belo dia, os sonhos mortos e apodrecidos tornam o ar difícil de respirar e passamos a desejar a morte, a morte que nos livrasse de nossas certezas, de nossas ocupaçoes, e daquela terrível paz das tardes de domingo.
 (Em O diário de um Mago, Paulo Coelho).


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